Saúde na era dos wearables
Pode parecer futurista, mas caminhamos para um mundo onde vamos acordar pela manhã e receber a informação exata de quais suplementos e vitaminas consumir com base nos sinais emitidos pelo corpo durante o sono, receber um alerta quando estamos com febre ou ainda quando os níveis de cortisol estiverem alterados, indicando um quadro de estresse ou um problema mais grave de saúde, que pode ter os efeitos mitigados caso a ida ao hospital seja imediata. Estamos falando da era dos wearables e os relógios inteligentes, em que os usuários passam a estar conectadas à tecnologias digitais, com o objetivo de melhorar a forma como os cuidados de saúde são prestados aos pacientes.
Smartwatches, rastreadores de atividades físicas e outros tipos de wearables estão se tornando quase tão comuns quanto celulares, tablets e laptops. Somente no ano passado, o mercado global de relógios cresceu 30% e a Índia aumentou sua participação em 171%, na comparação com 2021, se tornando o maior mercado no 3° trimestre de 2022. Uma recente pesquisa com o tema Dispositivos de Monitoramento Rmoto de Pacientes da GlobalData prevê que o mercado de tecnologias vestíveis aumentará de US$ 548,9 milhões em 2020 para US$ 760 milhões em 2030, a uma taxa de crescimento anual de 3,3%.
Os números indicam que seguimos em direção a um cenário em que a maioria das pessoas terá os seus gadgets conectados aos smartphones ou diretamente à internet para mapear a saúde, verificar e-mails, mensagens e redes sociais, controlar dispositivos inteligentes por voz e até realizar pagamentos. Eles fazem parte da chamada Internet das Coisas (IoT) e possuem como proposta de valor tornar a vida cotidiana mais saudável, prática e confortável.
Diante desse cenário, o questionamento que fica é: Até onde vai o limite entre alcançar uma vida mais segura e ainda assim garantir a privacidade dos dados gerados a todo momento? A resposta a essa pergunta é complexa, e envolve uma série de fatores e cuidados que devem ser adotados tanto por usuários quanto por empresas que se dispõem a coletar e armazenar essas informações. Ao longo desse artigo, buscamos responder o questionamento, trazendo exemplos e uma análise concisa de empresas e especialistas que demonstram os caminhos que podem ser seguidos para garantir a privacidade dos dados.
Antes de mais nada, é importante dizer que a provocação é genuína e se dá em meio a testes como o da Samsung, que firmou uma parceria com o InCor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP), em junho do ano passado, tornando possível à equipe médica do hospital acompanhar sinais clínicos em pacientes cardíacos durante o pré e pós-operatório. Para o projeto piloto, a Samsung utilizou a tecnologia Galaxy Watch4, um smartwatch de última geração, capaz de monitorar informações como saturação de oxigênio, detecção de batimentos cardíacos irregulares, monitoramento de pressão arterial, padrão de sono, eletrocardiograma e composição corporal por meio de bioimpedância. A expectativa é que a iniciativa reduza o tempo de internação dos participantes do teste, influenciando diretamente no custo para o acompanhamento integral do paciente.
O piloto com o Incor é só o início de um mercado cada vez mais aquecido e que ganha contornos capazes de revolucionar os cuidados com a saúde. Além da Samsung, sintetizado no case do Incor, a Amazon ampliou em fevereiro do ano passado nos EUA, o seu serviço Amazon Care, disponibilizando atendimento domiciliar virtual e presencial no país. Já a Apple, em seu relatório de junho, acenou para a ampliação do interesse da empresa em desenvolver produtos que ajudam as pessoas a conhecer e a proteger a própria saúde, por meio do Apple Watch e do iPhone, oferecendo dicas práticas com embasamento científico que ajudam a proteger a saúde e a segurança dos usuários.
Até mesmo robôs entraram na jogada . O número crescente de casos de depressão potencializado pela pandemia levou pesquisadores da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, a realizar um estudo utilizando um robô humanoide para administrar questionários de saúde mental à crianças. Os resultados demonstraram que os robôs podem ser verdadeiros aliados para lidar com o problema crítico, uma vez que para as crianças trata-se de um momento descontraído de brincadeira, descaracterizando a hostilidade do ambiente hospitalar. O estudo, realizado com 28 crianças e um robô, consistiu em uma sessão individual de 45 minutos em que elas interagiram com o mecanismo, enquanto sensores rastrearam os batimentos cardíacos e os movimentos da cabeça e dos olhos.
Deloitte explora 6 fatores para a cibersegurança
Diante desse mercado que não para de crescer, a Deloitte fez um levantamento apontando que no ano passado foram comercializados 320 milhões de dispositivos vestíveis de saúde e bem-estar e, até 2024, esse número provavelmente chegará a quase 440 milhões de dispositivos, com um crescimento anual de receita de 12,5%, superando 118 bilhões de dólares em 2028. O mercado parece empolgante, capaz de salvar vidas e reduzir sequelas, mas na mesma medida que esse novo mundo anima, é preciso estar vigilantes aos riscos que o cercam. Um relatório produzido pela Deloitte no ano passado lança um olhar crítico sobre o futuro da saúde através das lentes do risco cibernético. No texto, a consultoria explora seis fatores principais que impulsionam a cibersegurança no futuro da saúde, evidenciando ações que os líderes ligado à assistência médica podem tomar para ajudar a gerenciar os riscos de comprometimento dos dados.
O primeiro deles e mais fundamental diz respeito sobre a qualidade dos dispositivos e sob quais regras estão regulados, evidenciando a necessidade de empoderamento do usuário sobre essa temática para a tomada de decisão sobre qual dispositivo utilizar. O segundo ponto diz respeito à alta geração de dados, que somada ao fluxo mais intenso de compartilhamento fará com que eles possam ser combinados para um acompanhamento integral da saúde do usuário, mas esse mesmo benefício fará da privacidade digital uma alta prioridade em organizações médicas.
O alerta ocorre porque em um contexto em que dados são uma moeda de alto valor para a comercialização de produtos e serviços, é de extrema importância trazer para o centro da discussão a ainda existente vulnerabilidade dos softwares a ataques externos. Até mesmo um smartwatch bem projetado é construído por humanos e, portanto, pode conter erros no código, levando a vazamentos que comprometem a privacidade, perda, manipulação, sequestro dos dados e até escutas inadequadas.
Há ainda entre os fatores, o uso de inteligência artificial, acelerado durante a pandemia, que carece de uma análise proativa de ameaças em aplicativos, especialmente os de uso pessoal, jogando luz para a necessidade de as organizações estarem preparadas para permitir o design ético e a governança da tecnologia. Outro fator destaca a importância de ter soluções de segurança cibernética “amiga do usuário”, com ferramentas de fácil consumo. “Ter uma senha de 15 caracteres que deve ser alterada a cada 30 a 60 dias pode não ser uma forma eficaz de atrair consumidores que buscam acesso a serviços de saúde em seus dispositivos pessoais”, complementa o texto da consultoria, que destaca que se os indivíduos não tiverem visibilidade de seus dados pessoais e, de como eles estão sendo usados, podem relutar em compartilhá-los.
A agilidade também ganha papel de destaque no relatório, uma vez que as práticas típicas na área da saúde não são conhecidas por serem ágeis ou se adaptarem rapidamente às mudanças. O relatório do braço da consultoria nos EUA declara ser fundamental a implementação de esforços piloto para que possam se beneficiar de insights e aprendizados que tornem os recursos de pessoal, processo, tecnologia e dados mais ágeis e voltados para o futuro. Por fim, destaca-se a necessidade da coordenação do ecossistema em que as organizações estão inseridas. Isso porque, até 2023, as organizações que fazem parte de um ecossistema de negócios digital conectado terão 40% de seus casos de atendimento ao cliente iniciados por parceiros de negócios, que precisam primar pelas diretrizes de LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados).
No caso do piloto da Samsung com o Incor, as informações captadas pelos smartwatchs serão armazenadas em uma plataforma de dados de alta segurança, desenvolvida em parceria com uma equipe multiprofissional, de tecnologia, de inovação e médica do Instituto do Coração. A expectativa é que esse mercado tenha um crescimento anual de 12,5% nos próximos anos, superando 118 bilhões de dólares em 2028. No entanto, enquanto os wearables fazem parte da vida cotidiana, eles também coletam dados e se conectam a um número crescente de outros sistemas inteligentes.
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